O académico defende que a reforma do sector petrolífero em Angola, que retirou a função concessionária da Sonangol, está incompleta. Com dois livros sobre o sector petrolífero, aponta o caminho para o país ser mais competitivo num cenário em que há cada vez mais petróleo descoberto no mundo.
Lançou recentemente um livro em parceria com vários autores, que é um estudo comparado do Contrato de Partilha de produção usado no sector petrolífero em Angola e em vários países. Aliás em Angola, nas novas licitações, já está a ser aplicado o contrato de serviços com risco. Qual a diferença?
Isso já está na lei n.º 2 de 2004, Angola pode ter até 4 tipos contratuais. É verdade que o PSA [Contrato de Partilha de Produção] tem sido o principal contrato entre o Estado e os Operadores Internacionais de Petróleo e Gás (IOC) que actuam em Angola.
Cerca de 99% dos contratos assinados em Angola, antes das novas licitações que arrancaram em 2019, tem como base o PSA. Por que mudar agora o tipo de contrato?
O PSA tem mais vantagens para as IOC, ou seja, as chamadas associadas ou membros do grupo empreiteiro. É um contrato que tem vantagens e desvantagens. É mais atractivo para as empresas investidoras, mas também salvaguarda os interesses do Estado. Se comparado ao contrato de serviços com risco, o PSA é um contrato mais favorável para o sector privado, ou seja, para as empresas investidoras.
Porquê?
O Contrato de Partilha de Produção é um contrato onde os termos fiscais e financeiros são definidos de acordo com o acordado entre as partes. O PSA prevê também a divisão do profit oil ou petróleo lucro entre o Estado e as empresas. Normalmente, a maior fatia do bolo fica para as empresas e não é o caso nos contratos de serviços com risco.
Que características têm os contratos de serviços com risco que os torna mais favoráveis para o Estado do que para as operadoras?
São contratos utilizados essencialmente por países, como os Estados do Golfo, onde estes países têm uma produção de petróleo e de gás assegurada tipicamente pela NOC (national oil companies), ou seja, pelas suas empresas estatais e onde os investidores privados internacionais ou multinacionais estão apenas para apoiar a produção em projetos específicos, o que permite que a maior parte do bolo fique para o Estado. A percentagem de petróleo que fica com os investidores nos contratos de serviço com risco é menor em comparação ao PSA.
Mas nos dois contratos os investidores são pagos em barris de petróleo?
Obviamente que a diferença, em termos jurídicos, é que nos contratos de serviços com o risco os investidores, ou IOC, são pagos pelos serviços prestados e, por isso, são pagos em espécie. Desenvolvem, exploram e produzem petróleo e gás, mas eles recebem um pagamento pelos serviços, portanto, não há tecnicamente uma divisão como há no PSA. No Contrato de Partilha de Produção, na fase de produção, temos o cost oil, que também é chamado de custos recuperáveis. Tudo porque o investidor, por sua conta e risco, explora e, se descobrir crude em quantidades comerciais, passa a produzir e depois é dividido o petróleo entre o Estado e os investidores.
Mas os países que adoptam o contrato de serviços com risco tem operadoras fortes. Por exemplo, no Brasil, há o contrato de serviços com risco e a Petrobras tem o monopólio da produção e, por isso, apenas se paga à multinacional pelos serviços. Em Angola, a Sonangol ainda não tem músculo para carregar este peso, tal como faz a Petrobras ou a Saudi Aramco e outras petrolíferas estatais?
Em Angola, tipicamente o operador ganha o concurso público para um bloco, mas depois vai vender participações desse bloco a outras empresas, para diversificar o risco. Então, na prática, Angola tem um sistema de joint bidding. Uma Exxon Mobil, quando ganha um concurso público em países como Angola, depois vai vender participações deste bloco a outras empresas.
O PSA permite a mitigação do risco. Por isso é que a Sonangol fez o farm out nalguns blocos?
Então, o risco inicial financeiro acaba por ser diversificado e, tipicamente, nós também encontramos aí uma das grandes vantagens do Contrato de Partilha de Produção, que é a possibilidade de partilhar o risco com outros investidores, uma vez que o risco fica totalmente por conta do investidor.
Fonte: JORNAL EXPANSÃO